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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Nelson Jobim, ou seria Antônio Bertoni?

A queda do Nelson Jobim no Ministério da Defesa após uma entrevista polêmica publicada na Piauí está sendo alvo dos jornais, botequins e cabeças vazias.
Mas uma coisa em especial chama a atenção. Quando abordam o fato de que Nelson Jobim gostava de usar farda. Isso é interessante, e foi justificado de maneira ácida por um general reformado como "psicótica necessidade de se fantasiar de militar".
A verdade é que a situação me lembra uma crônica muito agradável de Ferreira Gullar. Nela Antônio Bertoni -e não Nelson Jobim- é apaixonado pela farda do militar, porém, é considerado incapaz para servir ao exército, e, logo de vestir a farda.
Ao invés de contar a história toda vou reproduzir aqui essa crônica que se faz poeticamente relevante nesse episódio da política brasileira.


CABO DE DOMINGO

Se você gosta da moça e quer tê-la consigo, o caminho legal é pedi-la em casamento. Foi o que fez Antônio Bertoni ao se ver tomado de paixão pela farda de nosso glorioso Exército. Não foi ao General Lott (nesse caso, o pai da moça), mas procurou a Circunscrição de Recrutamento e falou de suas pretensões. A família da moça era exigente: antes de mais nada, seu Antônio, é preciso saber se o senhor está fisicamente à altura de nossa casta filha. E lá se foi o rapaz, amoroso e não seguro, para o Serviço Médico do Exército, onde lhe tiraram a roupa, mediram, auscultaram, pesaram. Seria já um estranho princípio de noivado, mas nem isso: consideraram-no "incapaz".
Quem já teve um amor, sabe o que é isso. Três vezes maldita medicina -pensava Antônio Bertoni em seu quarto vazio-, que toma por taquicardia aquele bater de peito que outra coisa não é senão o pipocar da paixão! E decidiu-se, como verdadeiro apaixonado, a desrespeitar a lei: roubar a moça.
Roubou não é bem o termo: comprou. Foi à Alfaiataria Paissandu e fez a encomenda de uma farda. Uma farda de cabo. E desde então todo fim de semana (só aos sábados e domingos), Copacabana, Tijuca, Flamengo, pelos olhos de suas moças modestas, admiraram o porte do cabo Bertoni. Até que um dia, em frente ao quartel da 2ª Companhia, deram-lhe voz de prisão.
O Conselho de Justiça, vendo que Antônio Bertoni queria apenas "dar-se a ilusão de ser militar", absolveu-o, e o mesmo fez, mais tarde, o Supremo Tribunal Militar.
-Não sabia que seu ato era criminoso?
-Gosto da farda e só queria usá-la aos domingos e feriados.
-Ignorava as possíveis consequências disso?
-Não, mas de que outro modo ser cabo, se o Exército me enjeitou?
Devolveram a Bertoni a liberdade, mas não lhe devolveram a farda de cabo. Ah, liberdade aparente, prisão sem grades, que és tu agora, Copacabana, para um cabo sem farda? Domingos na Tijuca, festivos sábados da Penha, já nada sois! E tanto cabo que sai à paisana, sem licença, arriscando-se mesmo a levar cadeia...
Cabo Bertoni, nessa altura de sua paixão, bato-lhe continência e lhe digo: compre outra farda na Alfaiataria Paissandu.


Ferreira Gullar

Pois é! Não seria Nelson Jobim um amante da farda militar?


Beijos em suas vidas!